Universidade e racismo

A questão racial põe em xeque a universidade e o que ela representa quanto ao saber hegemônico. De um lado, questiona o saber acadêmico e demanda o reconhecimento de outros saberes também legítimos, mas excluídos e/ou estigmatizados pelo campus. De outro, pressiona pela democratização do acesso e revela o ilusionismo da ideologia meritocrática e dos mecanismos pretensamente democráticos para decidir quem tem o direito de freqüentá-la.

A universidade está diante da necessidade de repensar o seu papel e relação com a sociedade. Isso produz insegurança, especialmente na classe média. A resistência às medidas que democratizam a universidade, não apenas no que diz respeito ao ingresso mas também em relação ao seu funcionamento interno – por exemplo os concursos para docentes –, é um dos efeitos visíveis. É a própria ideia de que no Brasil vivemos sob a democracia racial que se encontra na berlinda.

No movimento desencadeado pela adoção de políticas afirmativas, incluindo as cotas raciais, há um claro desafio à hegemonia e à hierarquização dos saberes. Se a polêmica em relação às cotas aponta necessidades imediatas, a sua essência é o questionamento de uma educação colonizada, branca, machista, eurocêntrica e deslegitimadora dos saberes não aceitos pelos cânones. Os negros e pobres são rechaçados não apenas porque tiram as vagas da classe média, mas também porque são caracterizados como ignorantes, cujo saber e cultura não merecem reconhecimento, e são considerados incapazes de assimilar a cultura oficial, pretensamente erudita e científica. A acusação de que as cotas colocam em risco a qualidade do ensino universitário é sintomático desta forma de pensar.

A universidade é influenciada pelo racismo presente em nossa sociedade, afinal ela não é uma ilha isolada ou uma espécie de paraíso da racionalidade (a razão e a ciência não são imunes ao racismo e já houve épocas que o legitimaram). Contudo, a acusação de racista é algo que não deve ser usado indiscriminadamente, sob o risco da sua banalização e da injustiça contra o oponente. É puro sectarismo declarar que esta ou aquela instituição e/ou indivíduo é racista simplesmente porque se posiciona contrário às cotas. O mundo não se divide entre cotistas e não-cotistas e a adoção de cotas raciais não é consensual nem mesmo entre os negros e os seus movimentos.

Se de um lado é possível identificar sectarismo entre os defensores das cotas raciais, por outro, muitos dos seus críticos levantam a acusação de racismo invertido. Para estes, os afro-descedentes estimulam o racismo ao insistirem em suas reivindicações. Numa argumentação simplista, a defesa da cota racial provocaria o ódio do branco na medida em que este se vê ameaçado de perder a sua vaga na universidade e, efetivamente, ao perdê-la. O(a) branco(a) reagiria emocionalmente por se sentir prejudicado e processaria o(a) negro(a). Só Freud explica! Se o ódio surge nestas circunstâncias, apenas comprova o racismo envergonhado, latente e imerso na alma de tal indivíduo. Observe-se ainda que a ameaça de processo indica condições econômicas e, portanto, é um indício de um certo estrato da sociedade que se considera lesada em seus direitos de ocupar o campus.

O racismo na sociedade brasileira, e conseqüentemente também presente na universidade, ainda que disfarçado sob os auspícios da ideologia do mérito e da racionalidade científica, não será suprimido apenas pela adoção das cotas raciais. Ele está introjetado, ainda que latente, até mesmos em muitas das cabeças pensantes do campus. Se ele aflora em momentos como este, é a prova de que permanece como um traço cultural e social da nossa formação histórica.

16 comentários sobre “Universidade e racismo

  1. Meus cumprimentos a todos os leitores deste blog e a seu idealizador. Este se constitui em um espaço público de discussões, o que pode contribuir para o ajustamento de idéias e composições sociais.
    Quero, aqui, então, apenas chamar a atenção para um dado que parece haver escapado de todos. Não existe NEGRO. Existem NEGROS, sob múltiplos recortes.
    Consideremos apenas um entre os possíveis recortes: o recorte de classe e adotemos uma nomenclatura marxista e, então, reconheceremos a existência de um negro pequeno-burguês, um negro proletário e um negro lúmpen-proletário.
    Estas diferenças importam diferenças de demandas. Por certo, a reserva de vagas nas universidades PÚBLICAS não atende as demandas do proletariado negro, tanto mais do lúmpen-proletariado negro, posto que estes, em bom número, se evadem do aparelho escolar antes sequer de concluir o ensino fundamental.
    Desta sorte, a reserva de vagas no ensino superior tende a atender mais uma classe média negra que os estratos sociais onde se encontram os negros mais carentes de políticas públicas de desenvolvimento humano.
    Demais disso, o só fato de se estar reclamando reserva de vagas em universidades PÚBLICAS é um forte indicativo de que o problema não é, de fato, estritamente racial, mas educacional. O pleito por vagas nas instituições públicas se deve à descrença em relação à qualidade do ensino superior privado; e, não em razão de uma (inexistente) resistência das instituições privadas em receber alunos não-brancos. Aliás, nisto reside a diferença do caso americano (do qual copiamos o modelo de reserva de vagas) e o brasileiro.
    Além de tudo, parece mesmo que, sob a alegação de racismo no meio universitário, se reclame facilitação de acesso aos cursos de graduação (por meio de reserva de vagas) quando a seleção para estes cursos se dá através de provas objetivas. No entanto, não há reclamo de reserva igual para os cursos de pós-graduação stricto-sensu, onde a seleção se dá por critérios subjetivos (incluindo entrevista e, por vezes, cartas de recomendação).
    É obvio que se encontra recôndito, aí, o fato de que mesmo aos mestres e doutores negros não interessa a desvalorização de seu títulos pela popularização do acesso a este grau.
    O fato de eu ser negro não me faz cego para estas questões!

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  2. Boa tarde!
    Olha, vou dizer a mesma coisa que já disse a respeito da legalização ou não do aborto:
    a Educação é a raiz.
    Com Educação saberemos discutir (sem bater boca e senso comum) sobre o que é realmente importante para nós Brasileiros.
    Vou misturar as coisas agora, espero não levar “porradas” por causa disso…
    Vejamos o caso do Sr. Tiririca, recentemente eleito…
    Creio, sua imensa votação foi alimentada pelo “voto de protesto”.
    Acho ótimo protestar. Todavia, se a intensão desses eleitores era demonstrar à classe política que ela está “caduca”, o tiro saiu pela culatra.
    As “velhas raposas” da política estão festejando a eleição do Sr Tiririca.
    Pois, teoricamente, ele é despreparado e sujeito a manipulações (nesta afirmação não há preconceito, apenas realismo).
    Se a intenção dos eleitores do Sr. Tiririca era protestar, deveriam ter votado num candidato melhor preparado; esse sim seria uma “pulga nas cuecas” dos velhos “medalhões” da política nacional.
    Deveriam protestar votando num candidato com Educação, preparado para discutir questões como aborto e cotas raciais.
    Os eleitores do Sr. Tiririca perderam a oportunidade de nivelar por cima a classe política.
    Assim como o aborto e as cotas raciais, a política também deve estar alicerçada na Educação.
    Com Educação saberemos votar. Saberemos ser a favor ou contra o aborto, as cotas… Teremos argumentos inquestionáveis, afastados do senso comum.
    Sou totalmente a favor das cotas e da legalização do aborto.
    Sou totalmente a favor da Educação e de oportunidades para todos.
    Espero que o Sr. Tiririca saiba aproveitar a oportunidade que está recebendo.

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    • Olá amigo, como você, espero que o deputado Tiririca possa de alguma forma
      valer-se da oportunidade que ele connseguiu através de seus própios méritos,
      para produzir algo de importante para a nossa sociedade.
      Abraços,

      Geraldo Martins ,
      Sociólogo.

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  3. Professor Ozai da Silva….
    Muito obrigado Professor Ozai pelos seus artigos que actualizando – me o dia a dia na sociedade brasileira, nao cria um embargo de fazer uma introspeccao embora de forma analoga sobre a realidade da sociedade mocambicana, alias, como tambem de tantas outras que se presem democraticas.
    Se por um lado o racismo na sociedade brasileira, esta também presente na universidade, ca em Mocambique embora tenhamos bocados do racismo, temos paralelamente a este um tribalismo muito forte entre o norte e o sul do pais. Tao triste ainda a verificacao destas concepcoes nos ambientes universitarios publicos uma vez verificar-se uma migracao de nortenhos como dizemos na nossa giria para o sul a procura de melhores condicoes de aprendizagem e formacao. Enquanto na sociedade brasileira o fenomeno racial transparece de forma disfarçada como se se tratasse de ideologias do mérito e da racionalidade científica, ca entre nos ocorre de forma directa e grossa porque e mais geografico e tribal em que lutamos para uma possivel descentralizacao e desconcentracao da coisa publica.

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  4. Mantenho minha opinião de que as cotas deveriam ser econômicas, não raciais. Por dois motivos preponderantes: o primeiro é que não é possível estabelecer um critério para definir quem é negro e quem não é. O segundo é que as cotas raciais incluem os incluídos. Ou seja, abre vagas privilegiadas para uma faixa das classes mais favorecidas.

    Mas respeito totalmente quem apoia as cotas raciais, pois minha visão só diz respeito ao que eu consigo interpretar do meu ponto de vista. Só conhecemos realmente o que vivenciamos. A partir do que vivi, minha opinião é que as cotas econômicas são mais justas.

    Abraço.

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  5. AS COTAS PARA NEGROS: POR QUE MUDEI DE OPINIÃO

    William Douglas*

    Roberto Lyra, Promotor de Justiça, um dos autores do Código Penal de 1940, ao lado de Alcântara Machado e Nelson Hungria, recomendava aos colegas de Ministério Público que “antes de se pedir a prisão de alguém deveria se passar um dia na cadeia”. Gênio, visionário e à frente de seu tempo, Lyra informava que apenas a experiência viva permite compreender bem uma situação.

    Quem procurar meus artigos, verá que no início era contra as cotas para negros, defendendo – com boas razões, eu creio – que seria mais razoável e menos complicado reservá-las apenas para os oriundos de escolas públicas. Escrevo hoje para dizer que não penso mais assim. As cotas para negros também devem existir. E digo mais: a urgência de sua consolidação e aperfeiçoamento é extraordinária.

    Embora juiz federal, não me valerei de argumentos jurídicos. A Constituição da República é pródiga em planos de igualdade, de correção de injustiças, de construção de uma sociedade mais justa. Quem quiser, nela encontrará todos os fundamentos que precisa. A Constituição de 1988 pode ser usada como se queira, mas me parece evidente que a sua intenção é, de fato, tornar esse país melhor e mais decente. Desde sempre as leis reservaram privilégios para os abastados, não sendo de se exasperarem as classes dominantes se, umas poucas vezes ao menos, sesmarias, capitanias hereditárias, cartórios e financiamentos se dirigirem aos mais necessitados.

    Não me valerei de argumentos técnicos nem jurídicos dado que ambos os lados os têm em boa monta, e o valor pessoal e a competência dos contendores desse assunto comprovam que há gente de bem, capaz, bem intencionada, honesta e com bons fundamentos dos dois lados da cerca: os que querem as cotas para negros, e os que a rejeitam, todos com bons argumentos.

    Por isso, em texto simples, quero deixar clara minha posição como homem, cristão, cidadão, juiz, professor, “guru dos concursos” e qualquer outro adjetivo a que me proponha: as cotas para negros devem ser mantidas e aperfeiçoadas. E meu melhor argumento para isso é o aquele que me convenceu a trocar de lado: “passar um dia na cadeia”. Professor de técnicas de estudo, há nove anos venho fazendo palestras gratuitas sobre como passar no vestibular para a EDUCAFRO, pré-vestibular para negros e carentes.

    Mesmo sendo, por ideologia, contra um pré-vestibular “para negros”, aceitei convite para aulas como voluntário naquela ONG por entender que isso seria uma contribuição que poderia ajudar, ou seja, aulas, doação de livros, incentivo. Sempre foi complicado chegar lá e dizer minha antiga opinião contra cotas para negros, mas fazia minha parte com as aulas e livros. E nessa convivência fui descobrindo que se ser pobre é um problema, ser pobre e negro é um problema maior ainda.

    Meu pai foi lavrador até seus 19 anos, minha mãe operária de “chão de fábrica”, fui pobre quando menino, remediado quando adolescente. Nada foi fácil, e não cheguei a juiz federal, a 350.000 livros vendidos e a fazer palestras para mais de 750.000 pessoas por um caminho curto, nem fácil. Sei o que é não ter dinheiro, nem portas, nem espaço. Mas tive heróis que me abriram a picada nesse matagal onde passei. E conheço outros heróis, negros, que chegaram longe, como Benedito Gonçalves, Ministro do STJ, Angelina Siqueira, juíza federal. Conheço vários heróis, negros, do Supremo à portaria de meu prédio.

    Apenas não acho que temos que exigir heroísmo de cada menino pobre e negro desse país. Minha filha, loura e de olhos claros, estuda há três anos num colégio onde não há um aluno negro sequer, onde há brinquedos, professores bem remunerados, aulas de tudo; sua similar negra, filha de minha empregada, e com a mesma idade, entrou na escola esse ano, escola sem professores, sem carteiras, com banheiro quebrado. Minha filha tem psicóloga para ajudar a lidar com a separação dos pais, foi à Disney, tem aulas de Ballet. A outra, nada, tem um quintal de barro, viagens mais curtas. A filha da empregada, que ajudo quanto posso, visitou minha casa e saiu com o sonho de ter seu próprio quarto, coisa que lhe passou na cabeça quando viu o quarto de minha filha, lindo, decorado, com armário inundado de roupas de princesa. Toda menina é uma princesa, mas há poucas das princesas negras com vestidos compatíveis, e armários, e escolas compatíveis, nesse país imenso. A princesa negra disse para sua mãe que iria orar para Deus pedindo um quarto só para ela, e eu me incomodei por lembrar que Deus ainda insiste em que usemos nossas mãos humanas para fazer Sua Justiça. Sei que Deus espera que eu, seu filho, ajude nesse assunto. E se não cresse em Deus como creio, saberia que com ou sem um ser divino nessa história, esse assunto não está bem resolvido. O assunto demanda de todos nós uma posição consistente, uma que não se prenda apenas à teorias e comece a resolver logo os fatos do cotidiano: faltam quartos e escolas boas para as princesas negras, e também para os príncipes dessa cor de pele.

    Não que tenha nada contra o bem estar da minha menina: os avós e os pais dela deram (e dão) muito duro para ela ter isso. Apenas não acho justo nem honesto que lá na frente, daqui a uma década de desigualdade, ambas sejam exigidas da mesma forma. Eu direi para minha filha que a sua similar mais pobre deve ter alguma contrapartida para entrar na faculdade. Não seria igualdade nem honesto tratar as duas da mesma forma só ao completarem quinze anos, mas sim uma desmesurada e cruel maldade, para não escolher palavras mais adequadas.

    Não se diga que possamos deixar isso para ser resolvido só no ensino fundamental e médio. É quase como não fazer nada e dizer que tudo se resolverá um dia, aos poucos. Já estamos com duzentos anos de espera por dias mais igualitários. Os pobres sempre foram tratados à margem. O caso é urgente: vamos enfrentar o problema no ensino fundamental, médio, cotas, universidade, distribuição de renda, tributação mais justa e assim por diante. Não podemos adiar nada, nem aguardar nem um pouco.

    Foi vendo meninos e meninas negros, e negros e pobres, tentando uma chance, sofrendo, brilhando nos olhos uma esperança incômoda diante de tantas agruras, que fui mudando minha opinião. Não foram argumentos jurídicos, embora eu os conheça, foi passar não um, mas vários “dias na cadeia”. Na cadeia deles, os pobres, lugar de onde vieram meus pais, de um lugar que experimentei um pouco só quando mais moço. De onde eles vêm, as cotas fazem todo sentido.

    Se alguém discorda das cotas, me perdoe, mas não devem faze-lo olhando os livros e teses, ou seus temores. Livros, teses, doutrinas e leis servem a qualquer coisa, até ao nazismo. Temores apenas toldam a visão serena. Para quem é contra, com respeito, recomendo um dia “na cadeia”. Um dia de palestra para quatro mil pobres, brancos e negros, onde se vê a esperança tomar forma e precisar de ajuda. Convido todos que são contra as cotas a passar conosco, brancos e negros, uma tarde num cursinho pré-vestibular para quem não tem pão, passagem, escola, psicólogo, cursinho de inglês, ballet, nem coisa parecida, inclusive professores de todas as matérias no ensino médio.

    Se você é contra as cotas para negros, eu o respeito. Aliás, também fui contra por muito tempo. Mas peço uma reflexão nessa semana: na escola, no bairro, no restaurante, nos lugares que freqüenta, repare quantos negros existem ao seu lado, em condições de igualdade (não vale porteiro, motorista, servente ou coisa parecida). Se há poucos negros ao seu redor, me perdoe, mas você precisa “passar um dia na cadeia” antes de firmar uma posição coerente não com as teorias (elas servem pra tudo), mas com a realidade desse país. Com nossa realidade urgente. Nada me convenceu, amigos, senão a realidade, senão os meninos e meninas querendo estudar ao invés de qualquer outra coisa, querendo vencer, querendo uma chance.

    Ah, sim, “os negros vão atrapalhar a universidade, baixar seu nível”, conheço esse argumento e ele sempre me preocupou, confesso. Mas os cotistas já mostraram que sua média de notas é maior, e menor a média de faltas do que as de quem nunca precisou das cotas. Curiosamente, negros ricos e não cotistas faltam mais às aulas do que negros pobres que precisaram das cotas. A explicação é simples: apesar de tudo a menos por tanto tempo, e talvez por isso, eles se agarram com tanta fé e garra ao pouco que lhe dão, que suas notas são melhores do que a média de quem não teve tanta dificuldade para pavimentar seu chão. Somos todos humanos, e todos frágeis e toscos: apenas precisamos dar chance para todos.

    Precisamos confirmar as cotas para negros e para os oriundos da escola pública. Temos que podemos considerar não apenas os deficientes físicos (o que todo mundo aceita), mas também os econômicos, e dar a eles uma oportunidade de igualdade, uma contrapartida para caminharem com seus co-irmãos de raça (humana) e seus concidadãos, de um país que se quer solidário, igualitário, plural e democrático. Não podemos ter tanta paciência para resolver a discriminação racial que existe na prática: vamos dar saltos ao invés de rastejar em direção a políticas afirmativas de uma nova realidade.

    Se você não concorda, respeito, mas só se você passar um dia conosco “na cadeia”. Vendo e sentindo o que você verá e sentirá naquele meio, ou você sairá concordando conosco, ou ao menos sem tanta convicção contra o que estamos querendo: igualdade de oportunidades, ou ao menos uma chance. Não para minha filha, ou a sua, elas não precisarão ser heroínas e nós já conseguimos para elas uma estrada. Queremos um caminho para passar quem não está tendo chance alguma, ao menos chance honesta. Daqui a alguns poucos anos, se vierem as cotas, a realidade será outra. Uma melhor. E queremos você conosco nessa história.

    Não creio que esse mundo seja seguro para minha filha, que tem tudo, se ele não for ao menos um pouco mais justo para com os filhos dos outros, que talvez não tenham tido minha sorte. Talvez seus filhos tenham tudo, mas tudo não basta se os filhos dos outros não tiverem alguma coisa. Seja como for, por ideal, egoísmo (de proteger o mundo onde vão morar nossos filhos), ou por passar alguns dias por ano “na cadeia” com meninos pobres, negros, amarelos, pardos, brancos, é que aposto meus olhos azuis dizendo que precisamos das cotas, agora.

    E, claro, financiar os meninos pobres, negros, pardos, amarelos e brancos, para que estudem e pelo conhecimento mudem sua história, e a do nosso país comum pois, afinal de contas, moraremos todos naquilo que estamos construindo.

    Então, como diria Roberto Lyra, em uma de suas falas, “O sol nascerá para todos. Todos dirão – nós – e não – eu. E amarão ao próximo por amor próprio. Cada um repetirá: possuo o que dei. Curvemo-nos ante a aurora da verdade dita pela beleza, da justiça expressa pelo amor.”

    Justiça expressa pelo amor e pela experiência, não pelas teses. As cotas são justas, honestas, solidárias, necessárias. E, mais que tudo, urgentes. Ou fique a favor, ou pelo menos visite a cadeia.

    *juiz federal (RJ), mestre em Direito (UGF), especialista em Políticas Públicas e Governo (EPPG/UFRJ), professor e escritor, caucasiano e de olhos azuis.
    Site do autor: (http://www.williamdouglas.com.br/)

    Ou seja, houvesse consciência histórica, não seria necessária a criação das cotas. COTAS SIM.

    Raimundo Marinho

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    • Realmente, falar é fácil.
      Quando se sente na pele é outra história.
      Mas, vendo o compromisso do Estado brasileiro e de seus gestores imcompetentes, fica difícil acreditar que a situação da educação brasileira melhore em curto espaço de tempo…

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      • Salve, meu mano.
        Não é questão de governo, mas de Estado. E não é necessária nem mesmo uma boa análise histórica, como essa que o companheiro pôs antes de você escrever, para saber que o estado brasileiro tem um desprezo completo pela instrução, pelas mais compreensíveis das razões.

        Abraços.

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    • Caro Raimundo, seu relato, na minha opinião, só reforça a necessidade de cotas econômicas. As cotas tem muito mais probabilidade de facilitar a vida de um jovem que teve todas as condições, do que alguém que não teve. O filtro da pobreza é muito mais apertado, no meu ponto de vista.

      Se houver cotas para quem não teve as chances necessárias, acho injusto que elas sejam dedicadas somente a um grupo. E, reafirmo, não existe critérios objetivos para definir a raça de alguém. Já a condição econômica é facilmente comprovável e mensurável. Aliás, o critério econômico já é hoje adotado pelo Prouni, por exemplo.

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  6. Na minha opinião não deveria haver cotas para negros. Pois não há diferença entre negros e brancos (ou pelo menos não deveria ter), acho que os negros deveriam disputar pelas vagas como qualquer pessoa.
    Cota para negros significa o mesmo que dizer que eles são inferiores.
    Acho que nem os negros deveriam apoiar a cota.
    Pois se querem direitos iguais devem tambem ter deveres iguais, se eu quero ingressar na universidade meu dever é passar no vestibular, negros tambem.
    A cota para negros em si a meu ver já é discriminação.
    Acho tudo uma hipocrisia dos que criaram essa cota.
    Hoje o estudo está acessivel a todos, só não estuda quem não quer.
    O problema é que nas escolas quem está impondo o ritmo da sala de aula são os alunos e não os professores, mas isso é um outro assunto.
    O sujeito não deixa de estudar porque é negro e sim porque é irresponsável, só quer boa vida, alguns só querem “pancadão”.
    Acho injusto cota para quem não tirou nota passar na frente de quem tirou, mesmo que tenha o problema dos alunos de escola pública sair na desvantagem.
    Acho que aluno de escola pública como eu sempre fui, deve se esforçar muito mais, ja contando com a pessima qualidade do ensino publico.

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  7. Professor, estou realmente perplexa, de forma positiva, vivendo em meio de tantas publicações veiculadas seja na mídia, no meio acadêmico que desqualificam e se mostram contra as reivindicações da raça negra, sinto-me neste momento em paz, num breve momento de trégua ao ler o seu artigo, pois são tantas lutas, mas sei que é preciso continuar, pois não estamos sozinhos.
    Parabéns

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  8. Perfeita analise professor
    Eu, por exemplo, acho que essas políticas microreformistas não levam a nada, mas eu não me oponho a ponto de dizer que isso vai criar um racismo invertido.
    O grande mérito dessas políticas de cotas é colocar em evidência a falácia do vestibular, pois muitos negros que estão nas universidades através das cotas tenho o mesmo desempenho dos não-cotista.
    O grande problema dos cotistas sectários é que eles acham que as cotas vão minimizar os problemas do negros brasileiros. Obviamente não vai criar um “racismo invertido”, mas cria outras desvantagens porque são reformas mais quantitativas do que qualitativas. Nos Estados Unidos, já elegeram um negro, mas até que ponto pode dizer que a situação do negro melhorou? Sabemos que metade do sistema carcerário estadunidense é composto por negros e os conflitos raciais são ainda muito fortes.
    No Brasil tem uma mania de tentar copiar coisas feitas de outros países e não enxergar a realidade brasileira que é diferente em outros países. Aqui o racismo não teve o carater segregacionista como nos EUA e na África do sul imposta por leis. No Brasil prevalece o paternalismo, o estado não criou leis segregacionistas contra os negros, mas efetivou políticas favoráveis ao embranquecimento, através da imigração européia no último quartel do século XIX. Essa é a diferença!
    O ingresso dos negros na universidade não pode ser feita apenas por essas políticas compensatórias. Deve ser questionado a validade do vestibular criado pela ditadura militar que efetivou uma verdadeira privatização e a exclusão dos segmentos marginalizados que não se restrigem apenas aos negros. Agora será que os cotistas e não cotistas discutem isso?

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  9. Na minha opinião, esse problema só existe pelo Estado brasileiro não dar condições de educação a todos, como está escrito na constituição desse país.
    Dessa forma, surgem movimentos tentando fazer justiças para certos grupos, mas, gerando injustiças para outros.
    Essas tentativas são apenas remendos sobre um buraco aberto pelo Estado.
    Que pelo jeito não vai ser fechado tão cedo.

    Sobre o racismo, criar regras se baseando nisso, só gera mais recismo e idéias erradas nas cabeças das pessoas menos pensantes.
    As quais irão defender uma bandeira quem nem sabem porque existe.
    Já que é para criar cotas, crie cotas sociais, por renda. Mesmo assim, irão faltar vagas!
    E continaremos a ter injustiças…

    Saudações!

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  10. Ora, basta verificarmos, quantos professores universitários negros existem? E se formos para a hierarquia universitária, fica-se mais claro o racismo, quantos reitores ou reitoras negros existem? Por que o rascismo não é explícito na maioria das vezes, como é algo cultural, penso assim, as pessoas nem se dão conta que operam no mundo com determinadas imagens e não conseguem enxergar o outro, nesse caso o negro , como alguém capaz de exercer funções em nossa sociedade.

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