Linguagem e ideologia do Império estadunidense

LOSURDO, Domenico. A linguagem do império: léxico da ideologia estadunidense. São Paulo: Boitempo, 2010, 303p

* Qual é a linguagem do Império? Como o seu léxico cumpre uma função ideológica justificadora do seu domínio mundial? Quais seus objetivos? A julgar pelo discurso ideológico dominante, o mundo atual divide-se entre a barbárie e a civilização, terroristas e não-terroristas, o retrógrado e a modernidade, Oriente e Ocidente, a religião e cultura islâmica versus a religião e cultura cristã-judaica. Nesta forma maniqueísta de compreensão do mundo, os campos são bem definidos. A priori, não cabem dúvidas sobre quem são os bárbaros e quem representa a civilização e sobre o papel dos EUA enquanto paladino da cultura e civilização ocidental.

Domenico Losurdo, com maestria e uma escrita cativante, desvela as categorias centrais da ideologia da guerra sustentada pelos EUA e seus aliados. Fundamentado num trabalho de pesquisa extenso e minucioso, próprio dos grandes intelectuais que exercem a crítica sem cair na tentação panfletária e na inversão maniqueísta e simplista dos “mocinhos” contra os “bandidos”, o autor de A linguagem do império brinda o leitor com uma análise rigorosa da ideologia estadunidense.

Dividido em sete capítulos, o autor inicia a obra com a análise crítica do terrorismo. Nos tempos atuais, essa palavra tornou-se central no léxico ocidental, e mais especificamente no vocabulário político-ideológico estadunidense.

A operação linguística levada a cabo pelos EUA desconsidera a própria história política-ideológica intervencionista, planos perpetrados pelos serviços secretos estadunidenses para eliminar persona non grata ao governo. E o que dizer, então, da política de Israel de “execuções extrajudiciais”? A licença para matar depende dos interesses políticos em jogo e de quem é santificado ou satanizado. Uma criança palestina, armada com pedras e em confronto com soldados israelenses em posse de armamento moderno, é classificada como terrorista; o mesmo não ocorre com o terrorismo de Estado praticado por Israel contra a população civil palestina. Prevalece a unilateralidade. Na retórica ideológica estadunidense, terroristas são sempre os outros, identificados como “bárbaros”. Os EUA e seus aliados detêm o poder de definir quem são os bárbaros e terroristas.

Losurdo analisa outras categorias centrais no léxico ideológico estadunidense: fundamentalismo, antiamericanismo, antissemitismo, antissionismo, filoislamismo e o ódio contra o Ocidente. De forma detalhada, rigorosa e exemplar, ele examina criticamente cada um dos argumentos que envolvem estas categorias. À medida que avança em sua argumentação, evidencia-se a pretensão ideológica dos EUA, o engodo que tal ideologia oculta e sua instrumentalização política no contexto de guerra.

A exemplo dos demais capítulos, o autor é especialmente feliz em oferecer ao leitor um painel histórico e analítico sobre as relações Ocidente-Oriente, o que se entende por tais categorias e como estas se metamorfoseiam historicamente. O Ocidente é uma categoria flexível cujas fronteiras são políticas, a depender dos interesses em jogo nos diversos contextos históricos.

Enfim, eis uma obra que merece ser lida por todos os que intentam aprofundar a compreensão sobre a realidade mundial e os dilemas atuais. É um livro instigante, repleto de informações que contribuem para o esclarecimento sobre categorias essenciais na atualidade, mas apropriadas pela ideologia dominante. Para a crítica desta, é preciso, primeiro, estudá-la e compreendê-la – livre do simplismo panfletista e do maniqueísmo. Trata-se de uma obra crítica, à altura do que se espera de um intelectual que assim mereça ser designado.


* Versão resumida da resenha A linguagem do império: léxico da ideologia estadunidense. São Paulo: Boitempo, 2010, 303p, de Domenico LOSURDO, publicada na REA, julho de 2010, disponível em http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/10600/5790

7 comentários sobre “Linguagem e ideologia do Império estadunidense

  1. Não li e não vou ler: alguém que confunde as preocupações e o combate ao terrorismo com “operação linguística levada a cabo pelos EUA”, não deve ser isento. Quando confunde a ação violenta e arcaica do Hamas e do Hesbolah com meninos palestinos com pedras na mão, lutando contra soldados armados, o autor se mostra condescendente com o fanatismo político religioso e mal informado.
    Provavelmente é um livro que fará sucesso entre os professores universitários, em especial entre os das universidades federais.

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  2. É bom ler esse livro aí para saber como pensam esse pessoal que acha que Karl Marx e Antonio Gramsci são as coisas mais lindas do mundo.
    Mas, depois de passar o porre com essas porcarias leiam Eric Voegelin, Arthur Schopenhauer, Mário Ferreira dos Santos, Olavo de Carvalho, Ludwig Von Mises, etc. para limpar a mente dessa sujeira.
    Abraços

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  3. caro Ozai, mais uma leitura-informaçao fundamental – obrigada. sem duvida um livro que vem estudar e abrir as cortinas de fumaça que tornam confusas as categorias com que lidamos todos os dias do nosso estar no mundo.
    abraço,
    Regina

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  4. Caro Ozai:
    Excelente resenha do livro do Domenico Losurdo, aliás a importância de pensadores como ele para entendermos as relações internacionais é fundamental. Porque o pensamento crítico, através da chamada “gramde media”, é cada vez menos difundido,.

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  5. Obrigada por partilhar esta obra. Estudarei e entenderei,como faço todos dias em situações mundiais,regionais ,pessoais e outras. Viver é simples mas compreender e aceitar realidades é dolorido. O que somos é o que nos faz viver(shakespeare_

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